sexta-feira, 29 de outubro de 2010

A identidade reinventada

Entre 1918 e 2008, Acácio Videira e a mulher dividiram as suas vidas entre Portugal, Angola e Brasil. Ainda que Maria da Conceição fale dessas terras como se coubessem em postais, o que fica para contar em forma de memórias, histórias, fotografias e excertos de filmes de Videira é suficientemente enorme para nos perdermos (e encontrarmos também). JP Simões esteve no Museu de Portimão, à conversa sobre o filme Acácio de Marília Rocha.

A realizadora foi à procura de qualquer coisa quando fez este filme – do tesouro de Acácio, como conta ao longo de uma viagem de comboio, que a ele lhe chama a atenção para o que foi vivido e em grande parte esquecido, e a ela lhe abre horizontes para uma outra forma de abordar a sua identidade e a do seu país.

O casal era vizinho da realizadora e relata aqui a sua vida itinerante, rica na exploração de diferentes culturas que em conclusão se interligam. Os tempos de Angola são os que Acácio relembra com maior nostalgia e gratidão.

As imagens das tribos, em sobreposição, evocam uma origem que também pode ser reinventada. De resto, a relação de Acácio e Maria da Conceição assemelha-se curiosamente à de José e Pilar que vemos no documentário de Miguel Gonçalves Mendes. Ela também é uma espécie de força motriz da relação e, neste caso, providencia um equilíbrio entre a sua tagarelice e os momentos de silêncio de Acácio. Por outro lado, a velhice deste homem contrasta com a vitalidade das imagens, comenta JP Simões. O entusiasmo com que falou do filme deixou transparecer uma auto-descoberta que se encontra com as descobertas de outros pelo caminho.
O músico, que além do seu projecto a solo integrou, nos últimos 16 anos, bandas como Pop dell’Arte, Belle Chase Hotel e Quinteto Tati, descreve o seu trabalho como “um trabalho essencialmente de auto-exploração”. De resto, a sua escolha para apresentar este filme não foi fruto do acaso. O avô era brasileiro, de Niterói, e a influência da música brasileira no seu estilo não escapa aos ouvidos mais atentos.

Entre algumas notas sobre a sua carreira, que se divide entre a música, a poesia, o cinema e outros voos, falou-se sobre a dificuldade de pensar as pessoas fora da cultura. As ideias de um povo, a sua arte e as suas práticas são aquilo que ele é, disse. E acrescentou ainda: “As opiniões das pessoas sobre as coisas dizem mais sobre as pessoas do que sobre as próprias coisas”.


 Fotografia: Jorge Godinho

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